Entendendo o contexto: Uma sexta-feira muito louca

Palácio do Planalto. Foto: Larissa Leite


Apreensão do celular do presidente e liberação do vídeo da reunião ministerial. Sexta-feira foi agitada em Brasília, mas qual o efeito destes acontecimentos? O que mudará?

Brasília amanheceu com céu azul e clima agradável. A cidade segue, apesar da sexta-feira agitada na Praça dos Três Poderes. O dia de ontem (22) foi marcado pelas notas e pela liberação do vídeo da reunião ministerial, esta apontada por Sergio Moro como a prova da interferência do presidente Jair Bolsonaro na Polícia Federal.

Os acontecimentos da última sexta-feira (22) foram: a divulgação da nota do General Augusto Heleno, a nota do gabinete do Celso de Mello, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e a autorização da exibição do vídeo da reunião ministerial, do dia 22 de abril. 

Para entender a sexta-feira e tentar vislumbrar os próximos acontecimentos, conversamos com uma especialista em investimento e finanças e com um advogado criminalista.

A nota do General Heleno

Advogado criminalista Andrew Fernandes, sócio do Bayma e Fernandes Advogados. Foto: divulgação.

A nota divulgada pelo General Augusto Heleno afirma que a apreensão do celular do presidente poderia trazer instabilidade para o país.

Logo depois do texto divulgado, políticos de oposição reagiram, Alessandro Molon, líder do PSB na Câmara dos Deputados, publicou em uma rede social: “Vamos representar contra o General Heleno por crime comum, com base na Lei de Segurança Nacional, e por crime de responsabilidade. A nossa democracia não pode se curvar neste momento, sob o risco de cruzarmos a última barreira que nos distingue de um regime totalitário. Basta!”

O advogado criminalista Andrew Fernandes não acredita que a nota do ministro seria uma reação antecipada ao vídeo da reunião ministerial, uma vez que o texto se tornou público antes da liberação do vídeo pelo ministro Celso de Mello. “Ademais, a percepção que o Ministro externou na nota, de que a apreensão do telefone do Presidente da República afeta a harmonia entre os poderes e poderá acarretar consequências imprevisíveis para a estabilidade nacional, não configura nenhum crime comum ou de responsabilidade”, explica.

Repercussão do vídeo

O que diz o mercado?

Durante a reunião, o ministro de Estado da Economia, Paulo Guedes, reafirmou a agenda liberal do atual governo.
Foto: Marcos Corrêa/PR

Quem traz luz a esta questão é a especialista em investimento e finanças, Catharina Sacerdote. Para ela, o vídeo divulgado nesta sexta-feira (22) deixa claro a agenda liberal defendida pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, e “o mercado financeiro reage super bem as agendas liberais. Os índices futuros (são propostas que são lançadas na bolsa a qualquer momento) subiram muito e o dólar futuro teve queda.”, afirma Catharina.

Ainda sobre as reações dos índices das bolsas de valores e as cotações da moedas estrangeiras, Catharina explica que: “o mercado financeiro vai reagir de acordo com a

Catharina Sacerdote, especialista em investimento e finanças. Foto: divulgação.

melhora ou piora do risco Brasil. Como após a divulgação do vídeo, e somente com ele, notou-se um baixo potencial para impeachment, e ainda, o fortalecimento da agenda liberal do Ministro Paulo Guedes. Assim, os investidores na bolsa brasileira passaram a propor contratos de valores mais altos para o IBOVESPA e mais baixos para o dólar. Esse índice do IBOVESPA futuro fechou com alta de 1,35% e o do dólar, com queda de 0,33%. Essa segurança repercutiu entre investidores estrangeiros também, já que o índice futuro na bolsa de NY fechou com alta de 3% – o que já é bem raro pra uma sexta.”

Para especialista, o país poderá ter uma crise institucional, mas não uma crise política. Catharina ainda observa que a articulação do Planalto com os deputados do ‘centrão’, também, contribui para reduzir as chances de um impeachment. Com relação as falas do presidente e o frequente embate com outros atores políticos e com a imprensa, ela entende que “há tempos o mercado financeiro bate palma para esse tipo de tensão. Desde a eleição dele, praticamente.

No vídeo da reunião ministerial, “há uma parte mais sensível no vídeo relacionada à China. Porque ao mesmo tempo que reconhecem a importância desse parceiro comercial, o fazem com desdém, com falas debochadas, e isso sim pode custar caro. E não é de hoje que acontecem esses tropeços diplomáticos com a China que pode reduzir os contratos com o Brasil. E ficou bem claro que há muito investimento estrangeiro na conta da agenda liberal. Seria preciso mais cautela e cuidado para lidar com os parceiros”, aconselha a especialista.

Dentro do cenário atual, Catharina Sacerdote também analisa a postura do Banco Central, e destaque que: “o Banco Central parece estar muito seguro da política de redução de juros para elevar a inflação. Isso se dá por meio do dólar mais alto também. O dólar nesse patamar de 5,00 é um dos efeitos do juros mais baixos, e sabemos que haverá pelo menos mais um corte”, finaliza.

 

 

Jair Bolsonaro defendeu os valores do governo dele durante a reunião do dia 22 de abril.
Foto: Marcos Corrêa/PR

E o que diz o direito?

“Ao liberar a divulgação do vídeo o eminente decano da Suprema Corte, entendeu que neste caso o interesse público à informação, liberdade de imprensa preponderava sobre outros princípios e valores”, explica Andrew Fernandes.

O conteúdo do vídeo ainda deverá ser debatido nos próximos dias e o advogado avalia que “na hipótese, de o vídeo trazer elementos da ocorrência de eventual prática de fato aparentemente criminoso praticado pelo Presidente da República ou seus Ministros de Estado, a atribuição para o oferecimento da denúncia recai sobre o Procurador Geral da República, competindo ao Supremo Tribunal Federal o processo e julgamento do caso.

De acordo com a análise do criminalista, as acusações feitas por Sérgio Moro não estão claras, “em nenhum momento fala que quer interferir na Polícia Federal, para fazer imperar interesses, ilícitos, escusos ou não republicanos.”

Assim, o que foi visto nesta sexta-feira (22), segundo a análise de Andrew Fernandes, “fortalece sobremaneira o Presidente da República, tanto juridicamente (sendo um forte elemento a demonstrar a inexistência crime comum), quanto politicamente (destacando seu forte compromisso com a democracia, liberdade e independência dos Poderes), enfraquecendo os pedidos de impeachment.” 

Para que o processo de impeachment aconteça, como advogado explica que “conforme estabelece a Constituição Federal o Presidente da República possui imunidade processual, ou seja, apenas poderá ser processado (por crime comum ou de responsabilidade) se a acusação for admitida por dois terços da Câmara dos Deputados. Assim, sem essa licença da Câmara dos Deputados não se pode iniciar nenhum processo contra o Presidente, quer seja por crime comum, quer seja por crime de responsabilidade”, finaliza Andrew Fernandes.

 

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