As redes e você

a internet e as redes

Olá, amigos leitores da “Bastidores de Você”. Hoje decidi escrever sobre como a internet e as redes tem nos conectado com outras pessoa e ao mesmo tempo tem nos desligado delas. Pode parecer paradoxal essa colocação, mas tenho percebido um sentimento de isolamento e de perda da própria identidade, causando profundo constrangimento.

Quando os criadores do Facebook tiveram a ideia de montar um local onde os estudantes pudessem interagir, duvido, com todas as forças que, seus proprietários imaginariam até onde ele iria.

No mesmo sentido os criadores dos aplicativos de mensagens, ou mesmo da Google, que surge como uma plataforma de busca de sites na rede, imaginariam o tamanho e a importância que teriam tais ferramentas nos dias de hoje.

Diante de tantas possibilidades de contato, vejo cada vez mais as pessoas preenchidas com um sentimento de solidão, quando mesmo estando imersas nessas redes e em contato com pessoas do mundo inteiro, elas ainda sentem a dor de olhar a sua volta e percebem que ao seu lado não há ninguém.

Antes de continuar, não estou aqui querendo atacar as redes sociais e aplicativos de mensagens, quero apenas discutir e tentar mostrar que esses mecanismos são só mecanismos de aproximação de pessoas, mas que cada um deve olhar para si e ver que vida está vivendo, a sua vida de verdade, ou se está confundindo com seu avatar.

Aliás, aqui cabe uma primeira reflexão e que vai nos guiar ao longo do texto. A palavra “Avatar” remonta ao hinduísmo e significa a encarnação de uma divindade sob a forma de um homem ou de um animal, sobretudo do deus Vixnu, segunda pessoa da trindade indiana, cujos avatares mais cultuados pelos hindus são Krishna e Rama.

Como já disse inúmeras vezes aqui, não existe palavra sem significado e o conjunto de significados, associado aos significantes dados é que montamos o discurso. Este por sua vez, orienta nosso psiquismo, pois nos constituímos como seres através do atravessamento do discurso e, neste sentido, a outra pessoa é fundamental para nos dar a nossa percepção de quem somos.

Em outras palavras, somente identificamos e nos percebemos como pessoas quando conseguimos nos conectar com outras e, especialmente, quando conseguimos perceber as diferenças entre o Eu e o Outro.

Essa nossa sociedade atual, baseada muito em redes sociais especialmente porque nelas a nossa capacidade e discurso é ampliada, pois em um simples vídeo, ou no apertar das teclas para escrever um texto, em minutos seu “post” pode correr o mundo.

Em uma primeira visão, pode parecer que isso seria bom, mas como estamos diante de uma sociedade de avatares, ou melhor dizendo, em uma sociedade onde todo mundo é um deus encarnado e um deus não pode adorar a outro deus, todos os deuses são adorados por quem está abaixo dele no panteão. Assim, temos a presença etérea do outro mas que não nos entrega aquilo que todo deus anseia: a adoração.

Há um exercício simples que pode ser feito. Como todos podem escrever o que desejam nas redes sociais, em nome de uma suposta liberdade de expressão, todo mundo se posiciona sobre tudo, mas dentro da internet ninguém é ouvido. Muito pelo contrário, não há mais a troca de ideias, não há mais o diálogo entre as pessoas, o outro simplesmente não existe de fato e as pessoas mergulham na ilusão de que estão sendo ouvidas.

Basta você reparar, estamos em época de eleição, tal como foi na presidencial, cada um exalta seu candidato, sua opção, mas não há debates de ideias, quem não concorda com a sua opinião lhe ataca, quem concorda curte o comentário e pronto.

Lembro-me da história de muitos expoentes da humanidade. Freud sofreu intenso preconceito, Lacan da mesma forma, mas ambos viveram em um momento em que suas opiniões eram debatidas, por vezes refutadas, mas o fato é que o debate, a conversa, sempre levou ao reconhecimento de uma evolução no pensamento.

Todo pensamento é baseado justamente na discussão, na aplicação do discurso. Desta forma, quando uma pessoa se posiciona e sua ideia é debatida, verdadeiramente, existe a enorme possibilidade de que desse debate as ideias melhorem e formem um novo pensamento, mais evoluído.

A essência do pensamento é justamente isso. Temos uma tese, que é oposta por uma antítese e do fruto dessa relação surge a síntese. Esta por sua vez, torna-se tese e que será oposta por uma nova antítese e desse novo choque nasce outra síntese e o ciclo se repete.

Na sociedade atual, nada disso ocorre, mesmo porque um avatar, o deus encarnado não pode aceitar que sua posição seja questionada, assim, em um movimento de economia psíquica, a pessoa anula a existência do outro.

Anulando a existência do outro, deus fica sem adoração, perde seu posto de centro das atenções e isso implica em uma dor insuportável, dor essa que se converte justamente no sentimento de solidão.

Esse vazio causado pela solidão, somado ao fato de que somente me reconheço pela diferença entre o Eu e o não Eu, quando não existe o outro, começo a me perder de mim mesmo. Desta forma, a vida se torna profundamente angustiante, pois não sou adorado e também não sei quem sou.

Quero concluir o texto sem condenar as redes sociais, mas para me posicionar no sentido de que elas são muito importantes, mas por outro lado, mesmo sendo importantes, nossos avatares não são reais, são uma fantasia. Com tal, a fantasia se faz necessária para o viver, mas temos que lembrar sempre de que o contato com o outro é fundamental, tanto para sentir o acolhimento, amparo, mas também para que a percepção da minha fronteira existencial somente ocorre com a percepção de onde termino e começa o outro. Avatares são importantes, mas quando se acredita somente no avatar, quando se personifica essa figura mítica, aí tudo se perde.

A internet e as redes sociais aproximaram tanto as pessoas que acabou por romper o limite entre o indivíduo e o outro. Somos mais avançados do que jamais poderíamos pensar, mas esse avanço nos colocou no dilema existencial: Quem sou eu? A resposta está na sua percepção quanto ao mundo que lhe cerca.

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