Pesquisadores da PUC-PR analisaram o mercado da bola por dois anos e trazem novas perspectivas sobre as transferências de jogadores brasileiros
Ele quebrou a banca na última janela de transferências do mercado europeu. Pelo valor de €100 milhões, Antony saiu do Ajax e se tornou jogador do Manchester United. Por £50 milhões, o atacante Richarlison mudou de casa e hoje defende o Tottenham. Saindo da Inglaterra, o valor da transferência de Raphinha pago pelo Barcelona poderá bater € 70 milhões.
Os altos valores podem representar um espanto, mas mantém uma tradição, o Brasil é um exportador de talentos para o futebol europeu. Interessados por essa dinâmica, um grupo de pesquisadores da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR) decidiu estudar o tema.
O estudo assinado por Rafael Kujo Monteiro, estudante da PUC-PR, e pelos professores da Escola de Negócios da instituição, Rodolfo Prates e Leonardo Frota, revela que os clubes brasileiros valorizam jogadores mais velhos e experientes em relação àqueles que estão despontando. Conforme essa valorização aumenta para os maiores jogadores, acaba ultrapassando a capacidade do mercado nacional, já que se tornam montantes comportados apenas pelo mercado europeu, transformando o Brasil num exportador de talentos.
Para chegar a essa análise, o estudo mapeou transferências entre os principais clubes brasileiros num período de dois anos (2018 a 2020). O objetivo foi mensurar fatores que afetam a probabilidade de um jogador ser transferido e, também, o valor das movimentações, além de verificar até onde as expectativas de performance dos atletas refletem nos valores das transferências – este, aliás, foi o primeiro levantamento a incluir tal fator na análise das negociações de transferências de jogadores de futebol no Brasil.
“Incluímos um índice inovador para capturar a capacidade dos jogadores de atuar de acordo com as expectativas dos especialistas”, pontua o estudante Rafael Kujo Monteiro, autor da pesquisa.
Até então, os estudos na área se concentravam mais no mercado europeu. Monteiro destaca que trazer a pesquisa para o contexto brasileiro é importante porque joga o foco para um país que tem tradição futebolística. Ele explica ainda que o levantamento foi feito em duas etapas, com metodologia que ajudou a lançar luz sobre como cada aspecto influencia as movimentações.
“Primeiro, calculamos a probabilidade de um jogador ser transferido de clube. Depois, estudamos os fatores que afetam o preço de um atleta que foi transferido”, afirma.
A escolha por essa metodologia busca retirar possíveis vieses. Sem a divisão em duas etapas, o fato de um jogador estar emprestado para outro clube, por exemplo, não afetaria o valor de uma transferência. Cerca de 9% de todos os jogadores do estudo estavam emprestados entre clubes da Série A do Campeonato Brasileiro, mas quando são observados somente os que se transferiram, a parcela sobe para 22%. Fica evidente, portanto, que o fato de ser emprestado para outro clube de Série A afeta não somente o valor da transferência, mas a chance do jogador se transferir.
“Após esse processo, a pesquisa mostrou que, no mercado brasileiro, as expectativas de performance têm um papel importante ao definir qual jogador é transferido e o valor da transação”, explica.
Atletas que superaram as expectativas de especialistas com relação à sua performance no ano, independentemente do nível de performance específico, tiveram mais chances de transferência e foram capazes de atrair valores maiores. Um jogador do qual se esperava um nível de performance baixo, mas que apresentou nível mediano, teve mais chances de se transferir do que outro jogador que também registrou nível mediano já esperado antes mesmo do campeonato iniciar. No caso de ambos se transferirem, o primeiro seria capaz de atrair valores maiores.
Uma implicação dessa constatação é o fato de que jogadores dos quais se espera nível altíssimo de desempenho – serem os melhores do campeonato – não conseguem superar expectativas. Assim, dificilmente apresentam maiores chances de transferências. Como as transferências estudadas eram somente entre clubes brasileiros, isso pode significar que caso os jogadores tops do Brasil se transfiram, é provável que eles sejam enviados para um clube do exterior.
Influências – O estudo mostrou ainda outros fatores que influenciam as transações: tempo restante do contrato, histórico recente de transferências do jogador e atuação do clube vendedor, além de características específicas do atleta, como idade e nacionalidade.
“Essas variáveis, contudo, já foram estudadas em mercados europeus e também são significativas nas movimentações brasileiras”, ressalta Monteiro, acrescentando que as descobertas mostram que o mercado brasileiro funciona de forma semelhante ao europeu, o que ajuda a ter uma visão global do funcionamento das movimentações e trazer novas perspectivas para a tomada de decisão.
Para gestores e agentes que participam do mercado, o levantamento é um ponto de partida relevante para decidir quem será transferido e por qual valor, pois ao mostrar que existem possíveis vieses na tomada de decisão, pode ser uma ferramenta para movimentações mais assertivas.
Segundo o estudante, os gestores de clubes podem considerar as expectativas antes de comprar um jogador. Caso se perceba que o esportista está sobrevalorizado porque superou expectativas iniciais, talvez seja melhor buscar jogadores de mesmo nível, mas que cumpriram as expectativas, para tentar “pagar menos” e obter o mesmo resultado. Da mesma forma, se o jogador superou o esperado, talvez o ideal seja esperar mais um tempo para perceber se realmente se trata de uma expectativa inicial errada ou se o atleta retornará ao esperado dentro de um curto/médio prazo, o que encareceria ainda mais a compra do jogador.
“Quando é sabido que as expectativas passadas influenciam as transferências, os gestores e diretores podem tentar mitigar isso considerando apenas a performance real do jogador”, aponta o especialista. “O preço, então, refletiria melhor a contribuição do jogador para o time”, conclui o autor da pesquisa.