Como a falta de integração tecnológica por parte do governo, afeta diretamente o combate à violência contra a mulher
Em 1997, eu que ainda era um garoto, comecei a trabalhar em um CPD (Centro de Processamento de Dados) de uma empresa de pesquisa de opinião. Antes da massificação das redes sociais, o único jeito de saber o que as pessoas achavam sobre determinado assunto, era perguntando pessoalmente a elas e depois contabilizar esses dados usando alguns métodos estatísticos bem específicos.
Em outras palavras, coletando as respostas de uma amostra da população e sabendo que, o perfil de uma amostra representa o perfil de um universo com uma certa margem de erro, podíamos, variando algumas questões como a quantidade de questionários aplicados, controlar o tamanho desse erro. Era como mágica! Com pouco mais de 2.000 questionários, conseguíamos avaliar como a população inteira de Brasília enxergava determinado problema, como por exemplo, se o governo estava fazendo um bom trabalho, o que era prioridade resolver, qual candidato tinha mais chance de ganhar as eleições e assim por diante.
Depois de 10 anos nessa empresa, aprendi com maestria a fina arte de realizar uma boa pesquisa de opinião e uma lição fundamental: Sempre esteja apoiado em dados antes de tomar uma decisão importante.
Quem me conhece sabe que sou defensor da tecnologia como ferramenta de transformação e, um dos temas que sou particularmente envolvido é o combate à violência contra a mulher. Já colaborei em vários projetos e estou sempre envolvido na promoção de eventos com o intuito de discutir sobre o tema, dando visibilidade a soluções de startups e empreendedores mais maduros linkados com o tema.
Não sei se você sabe, mas recentemente tivemos no Distrito Federal a CPI do Feminicídio, uma tentativa para descobrir porque os números oficias indicavam uma melhora na situação da violência contra a mulher, enquanto que na mídia as notícias apontavam o oposto. Sem entrar em mais detalhes, a conclusão da Comissão Parlamentar de Inquérito foi que o Estado falhou em amparar as mulheres vítimas de violência doméstica, apontando no relatório final, diversos problemas de integração entre os serviços, além da falta de estruturação dos trabalhos especializados.
“Problemas de integração entre os serviços”. Vamos entender o cenário:
Quando uma mulher sofre um episódio de violência, ela tem várias portas de entrada para a esfera governamental. Ela pode, por exemplo, entrar pelo sistema de saúde ao ser atendida em um hospital ou ainda entrar pelas delegacias especializadas quando fizer uma denúncia. Ela pode entrar pelos centros especializados de atendimento à mulher, ou por meio da justiça, ao solicitar uma medida protetiva.
Na verdade, existe uma sopa de letrinhas como PAV’s, NEPAV’s, NAFAVID’s, CEAM’s, DEAM’s e um monte de outros subsetores envolvidos, que geram dados e mais dados sobre cada mulher vítima de violência. Pois bem, como a própria CPI apontou, não existe uma integração desses órgãos e nem tão pouco uma centralização dessas informações para que o gestor possa entender como está a situação real.
Então eu pergunto: Como esse gestor toma as decisões?
O relatório da CPI refere-se a análise de 90 processos entre 2019 e 2021. Coincidentemente, em março de 2019, realizei um evento chamado Inovação no Combate a Violência contra a Mulher, cuja proposta era apresentar soluções feitas por empresas de Brasília para mitigar os efeitos dessa realidade. Uma solução bastante interessante foi apresentada pela empresa Voyager It Quality Assurance (https://www.voyager.srv.br/). Um sistema computacional (plataforma), capaz de integrar e contabilizar em tempo real a entrada de uma mulher vítima de violência, em qualquer instância governamental, e apresentar esses dados em um diagrama sinótico (resumido).
O que esses caras desenvolveram foi um jeito de capturar a entrada de qualquer mulher vítima de violência, em qualquer órgão do governo, e consolidar essas informações para fins de consulta, geração de relatórios e tomada de decisões em tempo real. “Imagine o gestor chegar pela manhã e encontrar uma tela como essa, contendo gráficos com a situação atual da violência contra a mulher, em qualquer região administrativa do Distrito Federal, atualizados em tempo real”.
Essas foram as exatas palavras usadas na apresentação, onde estavam presentes várias autoridades do governo local. Pelo relatório apresentado pela CPI, você já deve imaginar que essa solução nunca foi implantada. Então, eu volto a perguntar:
Afinal, como o gestor da pasta toma as decisões e define as políticas públicas?
Uma das possíveis respostas está no título desse artigo!
Não é novidade para ninguém que a pandemia da COVID-19 acelerou drasticamente muitos processos de transformação digital que estavam engavetados. Como disse um dos meus professores do MBA de Transformação Digital, o cientista Silvio Meira, “nosso aprendizado foi muito baseado no método ABC ou seja: no Aprendizado Baseado no Caos”. Pois bem, a parte do Caos nós já temos, agora só falta o aprendizado.
Quem trabalha em algumas esferas governamentais muitas vezes é ensinado a aceitar as coisas como elas são e não como elas estão. E entender esse “estar” com a possiblidade de “mudar”, daqui para frente é o que há.
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