Espetáculo teatral voltado para a primeira infância traz temas do imaginário brasileiro usando a técnica acrobática do bambu

bambu
Foto; Diego Bressani

Curta temporada na Sala Multiuso do Espaço Cultural Renato Russo 508 Sul

 A partir do dia 4 de maio, bebês e crianças de até 7 anos de idade vão ter contato com figuras, histórias, sons que habitam as lendas populares brasileiras. Um espetáculo voltado para a primeira infância quer, além de divertir e provocar os sentidos destes pequenos espectadores, despertar a curiosidade sobre aspectos da identidade brasileira. “De ponta cabeça” é encenação teatral calcada nas técnicas acrobáticas do bambu e estreia no dia 4 de maio, no Espaço Cultural Renato Russo 508 Sul – Sala Multiuso, reunindo uma equipe de bambas das artes cênicas de Brasília. “De ponta cabeça” fica em cartaz até o dia 12 de maio, sempre aos sábados e domingos, às 11h e às 16h. Sessões especiais nas manhãs do dia 5 (para crianças do espectro autista) e dia 12 (com tradução em Libras). A entrada é franca, mediante retirada de ingressos uma hora antes, na bilheteria do teatro.

“De ponta cabeça” apresenta duas crianças numa floresta, que procuram a primeira árvore plantada, em busca da história mais antiga do mundo. Neste percurso, elas brincam e interagem com a natureza, vasculham memórias ancestrais e, sobretudo, vivenciam os mistérios da floresta e as experiências ligadas ao imaginário brasileiro. Na base de tudo, o bambu, flexível, resistente, leve e que, a partir de uma técnica acrobática desenvolvida no Brasil, abre um leque de possibilidades cênicas.

O espetáculo reúne artistas de excelência da capital brasileira, como a diretora Maíra Oliveira, que dirige o Esquadrão da Vida, célebre companhia de teatro de Brasília, com mais de 40 anos de história; o dramaturgo, diretor e multiartista Jonathan Andrade e as atrizes Júlia Rizzo e Tainá Baldez, que exercem o ofício teatral há mais de 15 anos e têm vasta experiência com o público infantil.

O patrocínio é do FAC – Fundo de Apoio à Cultura, da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Governo do Distrito Federal.

O ESPETÁCULO

“De ponta cabeça” é calcado na poética e nos movimentos aprendidos em treinamento com a companhia Nós no Bambu, durante residência com Poema Mühlenberg. Sobre um tripé de bambu, as intérpretes vivenciam um relato que passeia pelos mitos da cosmologia indígena e africana, dando corpo a uma dramaturgia que foi concebida por Jonathan Andrade durante o processo de ensaio. Mas a narrativa do espetáculo não é explícita: quer sugerir, provocar os sentidos, estar presente.

Na encenação, a floresta é a personagem, atravessada por paisagens sonoras como sons do vento sobre as copas das árvores, murmúrio das águas e cantos dos pássaros, especialmente do pequeno Saci, passarinho de difícil observação, mas de canto frequente na Amazônia. As intérpretes se alternam: são crianças, guardiãs, passarinhas. “Na minha formação com o Esquadrão da Vida e, por conseguinte, com o teatro de rua, me sinto impelida a vivenciar o teatro para além do que seria a quarta parede, ou seja, percebendo todo o entorno, lidando com as interferências da rua e, ainda assim, pensar na dramaturgia e na atuação de forma a tocar e ser tocada, o que também é essencial no teatro para a primeira infância”, explica Maíra Oliveira. E complementa: “Daí vou solucionando tudo, como diretora, com o corpo e a vida das atrizes”.

A estrutura de bambu, durante o espetáculo, se transforma constantemente e a estória revela o encontro das crianças com Iroko, árvore sagrada, símbolo da longevidade, que abriga os espíritos infantis. Ela vai ensinar as crianças sobre o passar do tempo, sobre a memória da vida, sobre coletividade, sonho, futuro, infinito.

Pela narrativa transitam mitos brasileiros, como o Saci, que existe pelo menos desde o século XVIII e já recebeu diversas formas ao longo da história. Um dos mais conhecidos personagens populares brasileiros, o Saci já foi descrito como sendo branco como a Lua e com cabelos louros (na fronteira do Mato Grosso do Sul com Paraguai), com longa cabeleira ruiva, com um olho só, Saci que pode virar fogueira, barril, ser humano, animal. Saci com duas pernas ou com uma só. Em comum, a imagem da figura mitológica que é inspiração de liberdade e que ensina a usar a astúcia para vencer os poderosos. No espetáculo, esse que talvez seja o maior ícone do folclore brasileiro é apresentado em toda a sua complexidade: alegre, sábio, guardião e mensageiro dos espíritos da floresta.

E quem disse que não tem uma versão feminina do saci? Segundo lenda amazonense registrada por João Barbosa Rodrigues (1842-1909) no clássico da literatura indígena “Poranduba Amazonense” (1872-1887), a figura Saci, na Floresta Amazônica, é representada por uma mulher, de nome tupi Saci-Taperê, que significa “mãe das almas” e atua como espírito dos caminhos.

A encenação inclui um espaço de acolhimento, montado à entrada da sala de espetáculos. Com ambientação especial para receber os bebês, as crianças e suas famílias, o Espaço Azul oferece um primeiro contato com a cenografia feita com bambus, além de uma pintura assinada pelo artista Igor Baldez.

O BAMBU

 E nesse bambu tem saci?

Segundo algumas lendas, o Saci nasce do broto de bambu, permanecendo ali até os sete anos e, após esse período, sai para praticar suas travessuras entre os humanos e os animais. A escolha do bambu não é aleatória. O oco do bambu, segundo os japoneses, oferece o vazio que tudo abarca, pleno de possibilidades. Um vazio que é espaço para a criação, que dialoga com tradições, saberes, que ajuda a enfrentar os desafios contemporâneos com postura leve e inventiva.

O bambu é identificado com alta resistência, leveza, flexibilidade e grande eficiência como filtro das toxinas do ar. O material influenciou o professor de educação física Marcelo Rio Branco a criar, no ano 2000, as técnicas acrobáticas que foram aprimoradas com viés cênico performático pela companhia Nós no Bambu, ao longo de duas décadas. A técnica é única no mundo e revela imensas possibilidades cênicas e criativas.

O bambu inspira toda a ação em “De ponta cabeça”, como revela a atriz Júlia Rizzo: “Vivemos tempos distintos, a humanidade nunca passou pelo que ocorre agora. Fomos obrigados a ser como o bambu, nos curvar diante das ameaças e nos adaptarmos a outra realidade, onde a vida acontece, majoritariamente, entre quatro paredes. Depois da pandemia, é difícil saber como será o ‘novo normal’: o que ensinar para as nossas crianças? Quais as profissões do futuro? A única certeza é a imprevisibilidade e a rápida transformação do mundo”.

Neste sentido, o bambu tem muito a ensinar. A planta gera raízes profundas, envolve um ideal de coletividade (raramente um bambu está sozinho), não cria galhos supérfluos, os nós servem para fortalecer (e lembrar das dificuldades passadas), só cresce para o alto e é oca para acolher. Dizem as atrizes: “Queremos que as crianças percebam, mesmo que num plano sutil do inconsciente, toda a energia potencial existente em seus pequenos corpos. Que compreendam que passarão por diferentes transformações ao longo do tempo, mas que ainda serão elas mesmas, e que entendam a necessidade de serem flexíveis como o bambu para se adaptarem ao mundo e o transformarem”.

FICHA TÉCNICA

Direção: Maíra Oliveira

Com Júlia Rizzo e Tainá Baldez

Dramaturgia: Jonathan Andrade

Direção musical: Mavi Dutra e Filipe Togawa

Direção de arte: Ianara Elisa

Preparação corporal: Poema Mühlenberg

Cenografia: Ianara Elisa e Mônica Nassar

Figurino: Deni Moreira

Iluminação: Ana Quintas
Produção: Filmes de Apartamento

Produção executiva: Ana Paula Martins

Financeiro: Márcia Vale

Fotografias: Diego Bresani

Arte gráfica: Jaú

Artista Plástico: Igor Baldez

Design Corpo Bambu: Poema Mühlenberg

Fotografia Still: Rafaella Costa

SERVIÇO

Local: Espaço Cultural Renato Russo 508 Sul – Sala Multiuso

Data: 4 e 5, 11 e 12 de maio de 2024

Horários: 11h e 16h

Sessões especiais: 5 de maio, às 11h, Sessão Azul para crianças do espectro autista, e dia 12 de maio, às 11h, sessão com tradução em Libras

Ingressos: entrada franca, mediante retirada de ingressos uma hora antes, na bilheteria do teatro.

Classificação indicativa: crianças de 0 a 7 anos

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