
Às vésperas do Dia Nacional da Saúde Bucal, a realidade no Distrito Federal contrasta com o propósito da data. Quase 19 mil pessoas aguardam por atendimento odontológico especializado na rede pública, com tempos de espera que ultrapassam 300 dias em algumas especialidades. Os dados são do painel Acompanhamento SUS DF, do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios.
As maiores filas de espera concentram se em duas áreas específicas: prótese dentária e endodontia, popularmente conhecida como tratamento de canal. Juntas, essas especialidades somam mais de 13,4 mil pacientes aguardando atendimento. Na sequência, aparecem a odontopediatria, com 1.861 pessoas na fila, e os atendimentos para distúrbio temporomandibular, cuja espera chega a 313 dias, o maior tempo registrado. Outro ponto crítico é o atendimento pré-operatório odontológico de pessoas com deficiência sob anestesia geral, com espera de até 238 dias.
Segundo o cirurgião dentista Gustavo Delmondes, da Benve Odontologia, o problema é antigo e de natureza estrutural. Ele explica que a odontologia pública enfrenta uma defasagem de profissionais e equipamentos, especialmente nas áreas reabilitadoras, como prótese e endodontia. Essas especialidades exigem mais tempo de cadeira e materiais caros, o que torna o atendimento no SUS mais difícil de manter em volume adequado. Delmondes destaca ainda que o custo e o tempo de execução dos procedimentos dificultam o fluxo de atendimentos, citando que um tratamento de canal pode exigir várias consultas, enquanto a confecção de uma prótese depende de etapas laboratoriais que o serviço público nem sempre consegue absorver.
A demora no atendimento tem impactos diretos na saúde e na qualidade de vida da população. A cirurgiã dentista Samara Agatha ressalta que um dente perdido sem reposição compromete a mastigação, a fala e a autoestima. Ela alerta que um canal não tratado pode evoluir para infecções graves e até resultar em internações hospitalares. A fila de espera não representa apenas um número, mas simboliza dor e perda de qualidade de vida para milhares de pessoas.
Enquanto algumas especialidades enfrentam filas imensas, outras registram demanda reduzida. A cirurgia bucomaxilofacial, por exemplo, tem apenas quatro pessoas na fila, com espera de até 58 dias. Já em prótese dentária, há quase 7 mil pacientes, e o tempo médio de espera sequer é informado, o que indica possíveis falhas no sistema de monitoramento. Essa disparidade, na avaliação dos especialistas, revela uma má distribuição de recursos e profissionais dentro do sistema.
Como possíveis soluções para o problema, os dentistas defendem a ampliação de parcerias entre o poder público e instituições de ensino. Samara Agatha cita exemplos de faculdades de odontologia que realizam atendimentos em cooperação com o SUS e ajudam a reduzir as filas, sugerindo que esse tipo de iniciativa precisa ser ampliado e incentivado. O Dia Nacional da Saúde Bucal foi criado para promover a conscientização sobre os cuidados com a boca e os dentes. Enquanto o país celebra a data, a situação no Distrito Federal escancara a urgência de políticas públicas mais eficazes, com milhares de brasilienses aguardando por um tratamento essencial para comer, sorrir e viver com dignidade.




















