Neste fim de semana, seis equipes disputaram, na pista e fora dela, três vagas para a etapa nacional que acontece em São Paulo no próximo mês. Do DF, Team Mako venceu a regional e dois times de Pernambuco também se classificaram para a etapa nacional
O caminho é longo e árduo para quem sonha em entrar para o circo da Fórmula 1. A categoria de automobilismo mais famosa do mundo reúne pilotos, engenheiros, gestores, comunicadores e profissionais de várias áreas. Do outro lado, a própria categoria criou o F1 in Schools (F1 nas escolas, em português), um projeto educacional que fomenta o conhecimento e o empreendedorismo entre estudantes de 9 a 19 anos.
O desafio principal dos alunos é desenvolver uma miniatura de F1 e colocá-la na pista para uma corrida um pouco diferente, seguindo o modelo de arrancada, quando dois carros disputam qual será o mais veloz. O protótipo, movido a CO2, pode atingir até 70 km/h em uma pista de 20 metros de comprimento. As escolas participantes disputam etapas locais, e as melhores se classificam para a final, que acontece durante alguma das etapas do calendário da Fórmula 1.
No ano passado, a final do F1 in Schools foi realizada em Abu Dhabi com a presença de Nico Rosberg, campeão da categoria em 2016. Os ingleses do time Evoke UK levaram a melhor, mas o Brazilian Six, a equipe de São Paulo, ficou em oitavo lugar.
Agora em 2020, o campeão do programa deverá conhecido em Cingapura, no mês de setembro. As escolas brasileiras que queiram participar do projeto poderão se inscrever depois da realização da final nacional em São Paulo.
A etapa regional
Olhares concentrados e o nervosismo se fizeram presente durante o fim de semana no Colégio Galois. A etapa regional contou com três times do DF, duas equipes do Galois e uma do La Salle e os outros times, dois representaram Paulista, cidade do interior de Pernambuco, e outro de Macapá.
No sábado, 1, as equipes montaram os stands, alinharam os últimos detalhes e puderam treinar a largada. No dia seguinte, foi a hora da verdade. Os times são avaliados em diversos critérios, ao total, são mil pontos em disputa, sendo que as mini-corridas valem 250 pontos.
Team Mako, representando o Cólegio Galois, foi o grande vencedor do fim de semana. Com o resultado, os estudantes agora estão de olho na final nacional em São Paulo, se conquistarem essa etapa, os alunos irão para o mundial com tudo pago. O piloto da escuderia, João Pedro Carvalho destacou que “ser o piloto do carro é uma responsabilidade muito grande, porque o tempo de reação é o determina o resultado e é preciso muita concentração. Minha equipe é fenomenal e teve uma relação quase simbiótica. Nos dedicamos muito, estamos focados e animados. Que venha São Paulo!”
Em segundo lugar ficou a Falcon Racing formada por estudantes de Paulista, Pernambuco. O resultado mostra a dedicação dos alunos, como conta Yasmin Amaral “somos da escola pública Escritor José de Alencar. A gente não tinha recurso nenhum, mas nos empenhamos muito. A parte mais complicada foi o carro. A gente chegou aqui com uma única chance e fizemos acontecer”.
Em terceiro lugar ficou a escuderia Phoenix, a equipe formada apenas por meninas também veio de Paulista (PE). “Somos a única equipe feminina de escola pública do Brasil e a gente queria mesmo causar este impacto. Nós temos a nossa singularidade e queremos trazer isso para a competição. Estar nesse projeto não é fácil e a gente sabe a responsabilidade de estar em uma final nacional. É muito difícil, mas a gente chegou até aqui pela nossa força de vontade. Agora, vamos nos organizar ainda mais e fazer de tudo para ser um sucesso em São Paulo”, garantiu Letícia Moreira, a líder do time.
F1 in Schools
A primeira edição do F1 nas escolas aconteceu em 1999 no Reino Unido, de lá para cá, o desafio evoluiu e mais países começaram a se envolver no projeto. A final de 2019 em Abu Dhabi, contou com 55 equipes, na edição deste ano, tem-se a participação de mais de 17.000 escolas de 44 países.
O desafio consiste em desenvolver uma miniatura de F1. As escolas se inscrevem no programa e as instituições podem realizar seletivas internas para escolher os alunos que farão parte do time. Rodrigo Carvalho, professor de educação tecnológica e robótica, conta como os dois times que representam o Colégio Galois foi formado. “Desde o começo a gente trata como se fosse uma empresa. Então, abrimos um processo seletivo, fizemos um formulário on-line e eu e um outro professor fizemos uma pré-seleção de alunos. Depois, fizemos duas entrevistas, uma coletiva, na qual os alunos fizeram um desafio, e depois fizemos uma entrevista individual”.
Depois de selecionar os alunos e formar o time é hora de começar os trabalhos. O programa bilíngue fomenta o comportamento empreendedor dos jovens, afinal, eles precisam criar um plano de negócio e buscar patrocínios para viabilizar todos os custos do projeto. Além disso, eles criam estratégias de marketing e de mídias sociais.
Para projetar as miniaturas, os alunos passam a estudar química, matemática, física, em especial, a parte aerodinâmica, e os softwares usados para desenhar o carro. Como na F1, os alunos podem testar o carro no túnel de vento, mas de forma virtual com ajuda de um software próprio.
Organizador do programa no Brasil e representante da F1, Waldemar Battaglia, é um apaixonado por automobilismo, ele trouxe o projeto em 2014 para o país e de lá para cá reconhece os efeitos positivos que o desafio traz para os participantes. “Os times formam uma startup que por coincidência é uma escuderia de Fórmula 1, que dá o gostinho da competição, da velocidade, do carro, tudo que essa molecada também gosta.”
O trabalho das equipes que disputaram a etapa regional começou em novembro do ano passado. Todas as equipes receberam matérias de estudo das áreas correlatas, como aerodinâmica, parte financeira do projeto, branding e outros assuntos. Os jovens também ganham a licença do software para desenhar e desenvolver o carro.
Presidente e fundador do F1 in Schools, Andrew Denford, acredita que “oferecer uma forma de aprender Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática (a sigla em inglês STEAM) e matérias relacionadas de maneira tão empolgante está alcançando ótimos resultados e sabemos que estamos aumentando a participação de estudantes nas carreiras de Engenharia”.
O professor Rodrigo elogia o programa e afirma que “é uma forma de aproximar os alunos do topo do desenvolvimento de pesquisa e tecnologia, além ser uma forma de aproximá-los do mercado de trabalho”.
Pontuação
Battaglia explica como o desempenho das equipes é mensurado ao longo do fim de semana de prova. Os jurados ficam atentos aos uniformes, aos stands e “dos 1000 pontos que eles são avaliados, eles precisam fazer uma apresentação verbal, tipo um Shark Tank, que eles vão falar sobre a gestão da empresa, isso vale 180 pontos. Eles têm uma apresentação de engenharia, eles falam dos conceitos de aerodinâmica, os materiais que eles usaram, porque fizeram a impressão 3D”, disse.
No entanto, os alunos não tem a obrigatoriedade de construir todas as peças, o programa entende que não são todas as escolas que irão ter acesso aos maquinários, como as impressoras 3D. A saída sugerida aos alunos é desenvolver o carro no computador e buscar parceiros, como Senai, escolas técnicas ou ainda faculdades, para que o protótipo ganhe vida. Como explica Battaglia, a partir dessa experiência os alunos “começam a aprender que uma engenharia precisa trabalhar com o pessoal da produção. É preciso desenvolver algo que seja factível de ser produzido”.
F1 criando oportunidades
Também na organização do programa, Jeferson Bugelli conta a história do estudante de um colégio particular em Itatiba, São Paulo, que tinha o desejo de estudar nos Estados Unidos. “No processo seletivo, esse aluno colocou que era líder do time da escola dele no F1 in Schools, isso fez com que se abrisse uma oportunidade dele, já no primeiro ano de faculdade nos Estados Unidos, conseguisse um estágio na área, dentro de um laboratório”, conta.
O programa coleciona histórias bem-sucedidas com participantes que se descobriram como profissionais, e outros casos em que a F1 abriu portas de trabalho ou vagas em instituições de ensino renomadas. Wlademar Battaglia conta um desses exemplos: “João Volo, criador da Brazilian Six, obcecado por engenharia e automobilismo, tinha o sonho de estudar engenharia mecânica na Alemanha. Passou na faculdade que queria com uma bolsa de 50%, aí ele participou da final e colocou no currículo que participou da final mundial do F1 in Schools. A faculdade o chamou e deu 100% de bolsa”.
O esporte e a educação
A partir desse ano, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) sofreu diversas modificações (leia mais) e o F1 nas escolas “se encaixa 100% no BNCC. Nós temos uma parceria com a Zoom, empresa de robótica, que (até então) não tinha nenhum projeto de empreendedorismo para o ensino médio. A Zoom pegou o BNCC e todos os itens que o Fórmula 1 (nas escolas) se encaixa nas diversas disciplinas. Foi feito também um estudo relacionando o Enem e o F1.
O F1 nas escolas é um programa “de metodologia ativa. As escolas aprendem a trabalhar com projetos, que é uma necessidade do BNCC, agora é tudo multidisciplinar. Outra coisa, o nosso projeto é bilíngue, então, todas as apresentações de material escrito são em inglês. O projeto consolidado que tem 17 anos a chancela da Fórmula 1”, conta Battaglia.
A escola recebe muitos benefícios ao entrar no programa e Waldemar Battaglia destaca que os professores recebem um tratamento diferenciado, e eles ganham um outro papel, “você (professor) é mentor. O papel principal do mentor é acompanhar as habilidades emocionais, porque vai ter atrito, vai ter briga, vai ter o chefe da equipe que quer demitir alguém”.